A pipoca é um milho mirrado, subdesenvolvido. Fosse eu
agricultor ignorante, e se no meio dos meus milhos graúdos aparecessem aquelas
espigas nanicas, eu ficaria bravo e trataria de me livrar delas.
Pois o fato é que, sob o ponto de vista de tamanho, os
milhos da pipoca não podem competir com os milhos normais. Não sei como isso
aconteceu, mas o fato é que houve alguém que teve a ideia de debulhar as
espigas e colocá-las numa panela sobre o fogo, esperando que assim os grãos
amolecessem e pudessem ser comidos.
Havendo fracassado a experiência com água, tentou a gordura. O que aconteceu, ninguém jamais poderia ter imaginado. Repentinamente os grãos começaram a estourar, saltavam da panela com uma enorme barulheira. Mas o extraordinário era o que acontecia com eles: os grãos duros quebra-dentes se transformavam em flores brancas e macias que até as crianças podiam comer. O estouro das pipocas se transformou, então, de uma simples operação culinária, em uma festa, brincadeira, molecagem, para os risos de todos, especialmente das crianças. É muito divertido ver o estouro das pipocas!
A transformação do milho duro em pipoca macia é símbolo da
grande transformação por que devem passar os homens para que eles venham a ser
o que devem ser. O milho da pipoca não é o que deve ser. Ele deve ser aquilo
que acontece depois do estouro. O milho da pipoca somos nós: duros,
quebra-dentes, impróprios para comer; pelo poder do fogo podemos,
repentinamente, nos transformar em outra coisa — voltarmos a ser crianças!
Mas a transformação só acontece pelo poder do fogo. Milho de
pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho de pipoca, para sempre.
Assim acontece com a gente. As grandes transformações acontecem quando passamos
pelo fogo. Quem não passa pelo fogo fica do mesmo jeito, a vida inteira. São
pessoas de uma mesmice e de uma dureza assombrosas. Só que elas não percebem.
Acham que o seu jeito de ser é o melhor jeito de ser.
Mas, de repente, vem o fogo.
O fogo é quando a vida nos lança numa situação que nunca
imaginamos. Dor. Pode ser fogo de fora: perder um amor, perder um filho, ficar
doente, perder um emprego, ficar pobre. Pode ser fogo de dentro: pânico, medo,
ansiedade, depressão — sofrimentos cujas causas ignoramos. Há sempre o recurso
aos remédios. Apagar o fogo. Sem fogo o sofrimento diminui. E com isso a
possibilidade da grande transformação.
Imagino que a pobre pipoca, fechada dentro da panela, lá
dentro ficando cada vez mais quente, pense que sua hora chegou: vai morrer. De
dentro de sua casca dura, fechada em si mesma, ela não pode imaginar a
transformação que está sendo preparada. A pipoca não imagina aquilo de que ela
é capaz. Aí, sem aviso prévio, pelo poder do fogo, a grande transformação
acontece: pum! — e ela aparece como uma outra coisa, completamente diferente,
que ela mesma nunca havia sonhado. É a lagarta rastejante e feia que surge do
casulo como borboleta voante.
Na simbologia cristã, o milagre do milho de pipoca está
representado pela morte e ressurreição de Cristo: a ressurreição é o estouro do
milho de pipoca. É preciso deixar de ser de um jeito para ser de outro.