Houve um tempo em que as religiões eram praticadas de uma
forma muito simples. Os povos cultuavam Deus que se mostrava sob a forma de uma
boa colheita, de um bom tempo, de prosperidade para todos. A seu modo
agradeciam com oferendas, cantos, danças, enfim, com festividades.
Para eles Deus era o sol que germinava as sementes lançadas à
terra, era a própria terra que alimentava e dava vida às sementes, era a chuva
bendita que vinha do céu para molhar a terra e fazer crescer as plantações,
matar a sede e encher seus poços de água. As árvores que davam bons frutos
também eram respeitadas e algumas eram objeto de culto.
Consequentemente a natureza era sagrada para aqueles povos
simples. Eles encontravam Deus em todos os lugares, toda manifestação da
natureza era uma manifestação divina. Chamavam essas manifestações de nomes que
sobreviveram ao longo dos milênios até nossos dias. Em cada religião essas
manifestações receberam nomes diferentes mas seus fundamentos são sempre os
mesmos.
E por que isso? Porque Deus se manifesta a todos em todos os
momentos e em todos os lugares. Eles eram simples e Deus era encontrado nas
coisas simples.
Com o passar dos séculos a humanidade evoluiu em todos os
sentidos, e no que diz respeito à religião foram criadas doutrinas e leis que
regulavam o modo de se cultuar Deus. Quem não se adaptasse a elas era considerado
um herege, pagão, infiel, bárbaro e outras coisas ainda piores.
O sacerdote deixou de ser um igual aos seus, passou a ser um
guardião das leis por ele mesmo criadas. Passou a ditar normas de conduta
ritual, deixou de auxiliar seus irmãos com o conhecimento das forças da
natureza e deixou de responder às indagações mais simples sobre o seu
dia-a-dia, seus problemas, suas angústias, suas aflições. Os sacerdotes eram a
única ligação com Deus e assim ninguém mais conseguia encontrar Deus nas coisas
simples, nos lugares comuns, mas apenas nos templos, a cada dia mais
grandiosos, mais ornados, mais bonitos. Deus passou a viver no céu num lugar
que ninguém sabe onde fica.
Deixaram de dizer que Deus está conosco no nosso dia-a-dia e
que podemos encontrá-Lo em tudo e em todos os lugares pelas Suas manifestações
mais diversas. Esqueceram-se de que na trindade divina, o Pai é o Criador, o
Filho é a Sua Criação, e que o Espírito Santo é a sua Manifestação entre nós.
Esqueceram-se de que Deus se manifesta nas mais diversas formas, a todos e em todos os lugares e que o Espírito
Santo nada mais é que a manifestação de seus mensageiros que nos acompanham em
nossa caminhada rumo a Ele, o Pai, o Criador.
A Umbanda nada mais é que um retomo à simplicidade em
cultuar Deus em aceitá-Lo como algo do qual nós também fazemos parte em vermos,
nas manifestações dos espíritos, a manifestação dos nossos mentores espirituais
ou como nós os chamamos, os nossos guias, e o templo de Umbanda é o local
destinado a essas manifestações espirituais. Os mediadores de Umbanda nada mais
são do que os antigos sacerdotes da natureza sempre dispostos a ouvir a quem
quer que seja, sem lhe perguntar de onde vem, qual o seu credo religioso, qual
a sua posição social, por que nada disso importa. O que interessa é que eles
estão ali e que foram conduzidos por mãos divinas.
Na simplicidade do ritual umbandista é que reside a sua
força pois não adianta um templo luxuoso cheio de pessoas ignorantes sobre a
natureza do Ser Divino. Quantas vezes encontramos pessoas que nada sabem a
respeito das forças divinas que habitam na natureza? Sobre isso um médium pode
falar com um pouco de conhecimento já que os Orixás são os regentes dessas
forças todas elas colocadas à nossa disposição desde o tempo da criação do mundo.
Quando vamos a um local, um ponto de força da natureza, muitos nos olham como
tolos ou como pagãos, e isso não é verdade. Se somos pagãos no modo de
cultuarmos o Criador através de suas mais diversas manifestações, bárbaros são
eles que estão distorcendo a essência do próprio Deus que cultuam.
A Umbanda é um movimento espiritual muito forte no astral e
que sempre esteve ativo, muitas vezes com nomes diferentes mas sempre ativo.
Cultuar os orixás na natureza nada mais é que reconhecer o lugar onde a Árvore
da Vida dá os seus melhores e mais saborosos frutos.
O crescimento de uma religião deve ser horizontal e nunca
vertical. O crescimento vertical das religiões levou os homens a se
antagonizarem usando o nome de Deus como desculpa. Entenda-se por crescimento
vertical a hierarquização do culto colocando-se vários sacerdotes sob as ordens
de uns poucos. No processo de crescimento horizontal, todos os sacerdotes são
iguais e têm os mesmos poderes e obrigações perante o conselho invisível dos
Orixás.
Todo crescimento vertical é perverso na sua execução por que
poda os mais capazes em detrimento dos mais espertos, intrigantes ou astutos.
Essa poda se dá no momento em que os mais capacitados em levar a mensagem ao
povo são bloqueados.
O dom natural em relação a qualquer religião não é algo que
se adquire numa escola. O máximo que uma escola pode ensinar é o ordenamento
das forças desse dom e o aprendizado de seu uso em benefício dos que praticam
aquela religião. Quando alguém tem um dom natural muito evidente os menos
dotados logo começam a bloqueá-lo por simples inveja. Isso é comum em todos os
rituais e religiões. Se aqueles que bloqueiam o dom natural de alguém dentro de
uma crença religiosa soubessem o erro que cometem não iriam fazê-lo em hipótese
alguma, pois o preço de tal atitude é muito alto.
O que importa atualmente é manter o maior contato possível
com as forças da natureza pois aí está o
maior mistério do ritual de Umbanda, o
ritual aberto a todos os povos sem distinção de cor, credo ou raça, já que as forças
da natureza atuam em todos os pontos do globo terrestre quase sempre de forma
oculta.
Antigamente a natureza regulava a vida dos seres e não o
contrário. Eis por que havia um equilíbrio natural das populações e do meio de
sustento das mesmas. O equilíbrio permaneceu por milênios incontáveis. Quando o
expansionismo das religiões verticais se fez sentir nesses locais o culto das
divindades naturais foi suprimido a ferro e fogo, a natureza foi desprezada e
destruída e a lógica simples do seu ritual foi suprimida.
Os espíritos guardiões olham para a natureza e vendo-a ser
destruída tentam lutar contra isso. O ritual de Umbanda é uma tentativa de os
espíritos guardiões da natureza reverterem esse processo de destruição da fonte
da vida no planeta. Porém muita resistência está sendo colocada por parte dos
adeptos das grandes religiões estabelecidas de forma vertical que não querem
perder o poder, em detrimento da livre manifestação dos cultos à natureza.
Que Oxalá permita que possamos reverter esse processo de
destruição por que se não conseguirmos isso virá o dia em que a falta de pontos
de força para a livre manifestação do divino trará como conseqüência a
esterilização do nosso planeta.
Que o ritual de Umbanda consiga na simplicidade do culto às
forças da natureza em seus pontos de força, realizar a comunhão dos homens com
o Criador por meio da sua melhor e mais saudável forma de culto, o culto na
natureza.
Fonte.
Livro - Doutrina e Teologia de Umbanda Sagrada (Rubens Saraceni)