O psicanalista e teórico suíço Carl Gustav Jung, em suas obras, trata de um tema que nomeou de inconsciente coletivo: morada das memórias mais remotas da humanidade como um todo, incluindo memórias representadas por símbolos e imagens que recebem o nome de arquétipos. Animal de Poder é um destes arquétipos.
Diferentemente do inconsciente pessoal que guarda resquícios do dia a dia somado a ideias e sentimentos reprimidos, o âmbito coletivo da parte desconhecida da mente humana pertence a todos nós, ainda que não tenhamos consciência disso. Sendo assim, mesmo sem querer, recebemos esses registros via universo como uma herança compulsória.
Nossos antepassados da pré-história – e posteriormente da Antiguidade – nos deixaram muitos registros de animais e seres mitológicos em paredes de cavernas. A relação do homem com o animal naqueles tempos era bastante diferente, uma vez que conviviam de modo muito próximo e, por toda a simplicidade do contexto material destes povos, enxergavam o animal como um irmão e não como um objeto. Era como um irmão mais velho, com muito a ensinar, cheio de poderes, inteligência e habilidades, que no contexto do xamanismo damos o nome de medicinas.
Estas medicinas inerentes aos animais (animal de poder), pouco a pouco foram sendo integradas pelo homem através da observação e imitação desses ensinamentos. A proximidade entre homem e animal os colocou em tamanha comunhão a ponto de conseguirem se comunicar e fortalecer tal relação.
Há relatos e registros de como nós, humanos, trazemos a força animal para nossas vidas. Sem ir muito longe, dinastias e reinos usaram figuras de animais em seus brasões; as fábulas que ouvimos na escola quando pequenos; as formas de expressão que usamos sem perceber durante o dia como “trabalho de formiguinha”, “memória de elefante”, “fulano é um touro”, são evidências de que, no fundo, compreendemos que a fauna não é tão irracional quanto julgamos.
Nós, sujeitos da contemporaneidade, carregamos o legado deixado pela sabedoria dos animais sem saber, por estarmos em um nível profundo de nossa consciência. No entanto, os povos nativos e as resistências atuais destes grupos codificaram essas forças e as preservaram através da crença nos Animais de Poder, espíritos naturais que representam as espécies do Reino Animal, e não o espírito da águia, ou da onça que morreu, mas o espírito da espécie águia ou da espécie onça como um todo.
O fato destes espíritos da natureza representarem uma crença mundial de tradições primevas faz com que tais energias sejam compreendidas, também, como arquétipos, pois compõem parte dos registros arcaicos do inconsciente coletivo. Contudo, para os povos xamânicos, tais espíritos são mais que isso, podendo assumir a função de guias, professores, curadores e, é claro, amigos, que se manifestam com o intuito de dar respaldo ao xamã em seu trabalho, o protegendo e orientando.
Não só o xamã, mas todos, sem exceção, possuem um aliado animal. Tal descoberta chegou até nós recentemente graças à popularização, muito positiva inclusive, do xamanismo nos centros urbanos. O animal de poder, com suas medicinas, não é uma força exterior a nós, mas algo que faz parte de quem somos individualmente, as potências e talentos de nosso animal são compartilhadas conosco.
Embora muitas pessoas tenham a curiosidade de conhecer seus animais, nem todas compreendem a importância desta revelação. Um animal de poder não é um amigo imaginário, tampouco um atributo para elevação do ego humano; é um aliado, um espirito natural poderosíssimo que requer respeito e reverência, o que não configura fanatismo ou adoração. A melhor forma de honrar seu espírito animal é invocando-o, sempre respeitosa e humildemente, através de cantos ou mesmo de chamamentos mentais ou visualizações.
A importância do encontro com esta forma de vida imaterial se dá pela possibilidade de autoconhecimento, e consequente conscientização acerca de minha natureza mais profunda, sem falar no sentimento de unidade que resulta da aproximação com esta energia, capaz de diluir a segregação homem-animal, possibilitando a compreensão da natureza como um organismo uno, do qual fazemos parte.
Portanto, se você ainda não conhece seu Animal de Poder, sinta no coração a possibilidade de agregar esta força a seu campo; e, para aqueles que já o conhecem, cabe repensar sua relação com esta força, pois uma boa parceria com seu aliado pode ser a peça do quebra-cabeça que estava faltando.