19 de dez. de 2015

O Umbandista contemporâneo e sua postura na sociedade (Por: Fernando Ribeiro)

Por: Fernando Ribeiro (Pirro D'Obá)

A Umbanda é uma religião de matrizes diversificadas; é em si brasileira com fundamentos próprios mas que em muito se influenciou por outras religiões (como o Candomblé, o Catolicismo, o Kardecismo) e também cosmologias universalistas e de vínculos magísticos (Xamanismos, Zoroastrismos, Filosofias ameríndias, gregas e orientais). Em pouco mais de cem anos ela se construiu e se desconstruiu diversas vezes.

Dessas idas e vindas, uma das situações que mais se destaca é o “público”, que antes e hoje se atrai por ela. O perfil desse “público” mudou bastante.


Quando a Umbanda surgiu com seus princípios de caridade gratuita, de fazer o bem sem olhar a quem, de ensinar a quem sabe menos e aprender com quem sabe mais, os que inicialmente por ela se interessaram foram aqueles que de certa forma não conseguiam se estabelecer na sociedade, e que frente aos preconceitos enraizados da convivência humana no Brasil viram na Umbanda um aconchego e um afago para os dramas e os pesos da vida.


A religião de Umbanda fez bem a muita gente já em seu início, deu identidade a quem se sentia desenquadrado, aceitou opções e vícios pra quem era julgado por escolhas, transformou em virtuosos aqueles que no senso comum eram apenas vistos como pessoas subalternas frente as hierarquias elitistas tão típicas do Brasil.

Ainda hoje é assim, muita gente se achega a Umbanda pela dor da convivência social, e em nosso chão sagrado percebem um outro caminho mais leve a ser trilhado. Porém, essa já não é mais a maioria.

A Umbanda ainda fornece aconchego para quem se encontra em desequilíbrio, a quem carrega traumas e dores, mas a nossa religião se consolidou como uma doutrina sólida de pessoas que aprenderam com as histórias e os trilhos de nossos guias e com os caminhos teológicos de nossa religiosidade.

Nossos Sacerdotes (os sérios) mais velhos, que se preocuparam em ouvir os antigos, em estudar as diversas fontes de conhecimento, que mesclaram cultura e filosofia aos rituais e preceitos, são a fonte para balizar o que a Umbanda vem se tornando. Ícones como Pai Ronaldo Linares, que se preocupam não só em praticar a Umbanda, mas também em ensinar, em repassar, em informar, são os responsáveis pela transformação que nossa religião vem passando nos últimos 30 anos.

Hoje um Umbandista é alguém que independe de classe social, de escolhas ideológicas, de posições políticas, pois ele mesmo (o Umbandista contemporâneo) faz parte de uma classe social, ideológica e política chamada Umbanda.

A Umbanda se estruturou de tal forma, que se afirmar Umbandista hoje é se colocar, se posicionar  e enfrentar os diversos preconceitos e outras percepções políticas e ideológicas de outras formas de pensamento encontrados no Brasil e no mundo.

Se afirmar Umbandista nunca foi uma coisa fácil, antigamente muitas pessoas sentiam vergonha, receio e medo de retaliação no trabalho, na família ou em qualquer meio social que transitasse. Atualmente também não é uma coisa fácil se afirmar Umbandista, mas diferentemente do passado, hoje temos uma estrutura intelectual montada para nos basear e enfrentar as dificuldades que aparecem.

Se perguntam sobre nossa história temos base, se perguntam sobre nossos ritos temos base, se perguntam sobre nossa necessidade de crer em Deus temos base, se perguntam o motivo que nos leva a crer e a lidar com espíritos temos base. Temos base para explicar tudo o que fazemos a quem se interessar pelo que fazemos, e temos base também para explicar tudo o que fazemos de maneira clara até para aqueles que nos acusam de coisas que não fazemos.

Antigamente era fácil acusar um Umbandista de qualquer coisa, de demoníaco, libertino, viciado, mas hoje não. Hoje o Umbandista realmente ciente de sua posição não cai e nem faz dramas frente as acusações que porventura vier sofrer; ele como um bom filho de Ogum enfrenta, com o bom senso de Oxalá e a calma de Nanã, e a perspicácia de Oxóssi  procura fazer magia não só com pemba e pontos riscados, mas principalmente com as palavras... Sim!!! O Umbandista faz magia com as palavras, com a linguística; como um bom malandro ele faz poesia, e filosófa sobre todos os temas pertinentes a humanidade. Pois afinal, o Umbandista faz parte de uma religião humanista preocupada com questões amplas dos seres humanos, seres vivos e o meio ambiente.

Hoje explicamos a Umbanda não só pela nossa realidade dentro dos terreiros, nós buscamos também na ótica das ciências humanas como a História, a Sociologia, a Geografia, o Direito, a Filosofia, uma maneira peculiar e intelectualmente avançada de dialogar com qualquer aspecto que se apresentar a nós.

Lidamos com fundamentalistas religiosos, com capitalistas gananciosos, com moralistas reacionários, com ateus militantes... E sem posar de vítimas somos capazes de ensinar coisas simples a esse pessoal todo referente as Leis Espirituais, ao Evangelho de Jesus e outros profetas, aos Canais energéticos do Mundo e do Universo, em paralelo aos Símbolos, Sentidos e Arquétipos de nossos Sagrados Orixás. Nós contornamos suas limitações intelectuais e linguísticas com a magia das palavras.
Somos capazes de através de nossa fé tocar o coração e mente daqueles que de alguma forma insistirem em nos enxergar por algo que não somos.

O Umbandista de hoje se apropria de fatos científicos, é capaz de interpretar a Bíblia e o Alcorão, é capaz de mergulhar fundo nos escritos de filósofos complexos, e sem perder a simplicidade e o pé no chão sobrevoar as culturas diversas sem fanatismos.

Dessas idas e vindas da Umbanda, a que mais chama atenção é essa... O Umbandista não é mais o mesmo de antes.. os de antes nos ensinaram muito para que honrássemos suas lutas.

Pode acontecer, como acontece, de alguns perfis fracos e aproveitadores tentarem se infiltrar no nosso movimento Umbandista (que é político e ideológico como qualquer outro), mas a preguiça de estudar e o receio de se mostrar como um militante de nossas causas na sociedade logo faz esse pessoal se esvair.

Como sempre, na Umbanda só ficam os fortes. Muitos podem vir e podem ir. Mas só os fortes ficam... Repito, só os fortes!   


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