A Umbanda nasceu dentro do território brasileiro, numa manifestação espiritual do Caboclo das 7 Encruzilhadas através da mediunidade de Zélio Fernandino de Moraes no Rio de Janeiro. Porém, socialmente ela foi no início do século XX, um movimento que proclamava um viés ímpar dentro do que se conhecia como religião no Brasil.
As três correntes predominantes até então eram o Cristianismo, o Candomblecismo e o Kardecismo.
O Cristianismo nos lembrava nossos antepassados Europeus, seus dilemas morais, suas culpas e suas aspirações ao paraíso perdido. O Candomblecismo carregava um teor cultural que nos levava a refletir sobre nossas raízes africanas, nossas origens e nossa miscigenação como fruto de uma corruptela que não poderia deixar pra trás o valor dos antigos ensinamentos. E o Kardecismo vinha trazer uma metodologia analítica a respeito de como funcionava o fenômeno espiritual nas mais variadas religiosidades, tendo como pano de fundo a visão do evangelho cristão.
A Umbanda não nasceu simplesmente como uma mistura dessas três correntes. Assim como toda religião, ela bebeu em fontes para se estabelecer; assim como o Cristianismo bebeu no Judaísmo, o Budismo bebeu no Hinduísmo, o Protestantismo bebeu no Catolicismo, assim como diversas religiões beberam em alguma fonte para expressar a necessidade de determinado povo a uma expansão teológica, espiritual e de interpretação das leis do Universo.
Pois bem, o que precisamos levar em conta é que a Umbanda cresceu ao longo de sua existência, e em muito se desligou das vertentes que a princípio lhe serviram de base teológica. Hoje não podemos afirmar que a forma como o Umbandista lida com os Orixás é a mesma forma que um Candoblescista, nem a maneira como lidamos com as perspectivas humanas e sociais são as mesmas de um cristão (seja ele católico ou protestante), e o jeito como lidamos com fenômenos espirituais em muito pouco se assemelha como os Kardecistas lidam.
A Ciência Umbandista se afastou dessas correntes ao longo de sua existência.
Temos de lembrar que o Cristão (ortodoxo) que realmente segue sua religião e confia sua espiritualidade para tal vertente acredita piamente na Gênese Humana advinda de contos bíblicos. As passagens que narram acontecimentos com Adão e Eva dão sentido ao Cristianismo a respeito do nascimento do Homem na Terra.
O Candomblé, por não ter nascido numa tradição escrita, se estruturou através da corrente verbal de contos e mitos a respeito dos Orixás. E os arquétipos dessas divindades ora podem dar um sentido mítico ao nascimento do Mundo e dos Homens, como podem estabelecer uma percepção natural a respeito de tais fenômenos no momento presente ao nosso redor.
O Kardecismo fica estreito a fatores muitas vezes internos das manifestações espirituais, se prendendo a passagens bíblicas e muitas vezes não conseguindo adentrar corretamente a realidade e manifestações de correntes religiosas fora do contexto que se propõe a analisar. Sendo assim a magia, os rituais, a teurgia, a dinâmica Umbandista e sua busca transcendente não se conecta muitas vezes ao que o Kardecismo se propõe a lidar em seus métodos.
Nós Umbandistas nos desvencilhamos dessas correntes, descobrimos através de revelações nos Terreiros e em pesquisas científicas que o mundo era mais antigo do que dito na bíblia dos cristãos. Ao longo de pouco mais de um século adentramos em realidades amplas, tirando o véu que encobria nossos olhos podendo então perceber que antes dos cristãos existiram muitas outras sociedades, com formas variadas de como lidar com a vida e a realidade, e tais sociedades muitas vezes serviram de base para que os próprios cristãos criassem sua forma de olhar o mundo.
Os Sumérios por exemplo, povo situado no sul da Mesopotâmia, atual sul do Iraque e Kuwait, durante a Idade do Cobre (ou Calcolítico) e a Idade do Bronze inicial. Os historiadores modernos sugerem que a Suméria teria sido colonizada por volta de 5500 e 4000 a.C. por um povo não-semita (fora do contexto judaico/cristão), e talvez nenhum povo tenha contribuído tanto para a cultura da humanidade que os sumérios.
Outros exemplo são os povos Vedas que se originaram na índia entre 2000 e 1500 a.C. formando a base do extenso sistema de escrituras sagradas do hinduísmo, que representam a mais antiga literatura de qualquer língua indo-europeia.
Sabendo historicamente da existência de tais povos, nós Umbandistas começamos então a olhar para as crenças existentes no mundo por um aspecto mais científico. Apuramos fatores mitológicos, escritos, orais por um viés de análise metafórica. Dessa forma conseguimos lidar com a realidade de que no mundo se estabeleceram diversos tipos de religiosidades e que nenhuma em si carrega a verdade absoluta a respeito das coisas, mas sim que em seus núcleos existem mistérios que servem de morada as pessoas que necessitam lidar com aquele tipo de perspectiva cosmológica naquele tempo e lugar.
Nos afastamos em muito dos contos bíblicos; a Gênesis com Adão e Eva não nos deu o devido sentido e nos distanciamos da visão Criacionista que enxerga a humanidade, a vida, a Terra e o universo como apenas uma criação de um agente sobrenatural (Deus) com rejeição de processos biológicos, físicos e químicos presentes na evolução..
Nós seguimos unindo fatores científicos a percepções espirituais. Ou seja, buscamos conciliar a ideia de Deus e a teoria da evolução trazida pelo inglês Charles Darwin no século XIX.
Assim, também nos afastamos da ideia arquetípica dos Orixás optando por transferir seus significados às energias encontradas em pontos da natureza. Dessa forma ficou mais fácil para que conseguíssemos assimilar o nascimento da espécie humana em meio de uma longa evolução de centenas de séculos sem que nos apegássemos na crença de que a Bíblia diz a verdade literal a respeito da criação humana.
Assim, também nos afastamos da ideia arquetípica dos Orixás optando por transferir seus significados às energias encontradas em pontos da natureza. Dessa forma ficou mais fácil para que conseguíssemos assimilar o nascimento da espécie humana em meio de uma longa evolução de centenas de séculos sem que nos apegássemos na crença de que a Bíblia diz a verdade literal a respeito da criação humana.
A Paleontologia (ciência que estuda as formas de vida existentes em períodos geológicos passados, a partir dos seus fósseis) viu-se obrigada a contestar a cronologia bíblica, mostrando que antes de Adão existiram outros homens, outras sociedades, outras crenças.
Hoje, os pesquisadores já demonstram, sem margem para contestações mais sérias, que a história do mundo e do homem se conta, não mais em alguns milhões de anos, mas em bilhões de anos! O Universo nasceu há mais de 15 bilhões de anos, a Terra, há 5 bilhões, a vida, há 4 bilhões, os mamíferos, há 200 milhões, e, enfim, o genêro humano, há 3 ou 4 milhões de anos. Quando apareceu o Homo Sapiens, já milhões de hominídios o haviam precedido sobre a Terra. Diante de tais fatores, nós Umbandistas nos apropriamos das sabedorias de cada povo que estudamos e que ouvimos nas incorporações e manifestações mediunicas, e dessa forma atribuímos a Deus um mistério muito mais amplo e complexo do que profetas foram capazes de escrever.
Para compreender a Gênesis bíblica, é bom lembrarmos que os antigos dispunham de lendas que contavam as origens do mundo e do homem. O que ocorreu uma vez nos tempos primordiais é fundador do presente, fonte do consenso de um povo e uma comunidade. O poema Sumério Gilgamesh (compilados no século VII a.C. ) coloca de uma maneira admirável as grandes questões do homem: a relação entre os homens e os Deuses, o lugar do homem no Universo e sua originalidade em relação aos animais, o sentido da finitude do homem, da vida em sociedade e do enigma da morte. Israel apenas se inspirou nele para construir um relato de grande profundidade que se tornou a abertura da epopeia bíblica.
Dessa forma, vemos a bíblia como um relato de sabedoria. E um dos traços do sábio é saber jogar com a língua, se servir das palavras para despertar a curiosidade, entreter, ensinar e comover.
Porém, nós Umbandistas buscamos ir além desse processo, através da história buscamos nos livrar daquilo que pertence a outras religiões e não a nós. A visão de pecado não é Umbandista, o mediunismo (formas primitivas de Mediunidade) atribuído muitas vezes a nós pelo Kardecismo não trata-se da nossa real forma de conexão com o Sagrado e o plano espiritual, a sabedoria africanista nos toca culturalmente nos cânticos e em algumas formas de culto a natureza, porém o uso e a interpretação metafísica que temos para com o mundo e o Universo se afasta quase que totalmente da maneira da teologia Candomblecista.
Para nós os Orixás são cósmicos, universais, energias da natureza que se entrelaçam e que cada religião lhes dá os nomes que melhor se encaixarem a suas realidades antropológicas. Pois além do evolucionismo científico, que em muito nos agrada e nos agrega intelectualmente, a evolução é o sentido real da vida.
Em nossa caminhada dentro da Umbanda, brasileira, centenária, entramos em contato com povos Celtas e os Druidas, entramos em contato com os Xamanismos das mais variadas partes do mundo que passaram por aqui e até se extinguiram, nos conectamos com bruxas e magos, filósofos e médicos, matemáticos e químicos, alquímicos e profetas, e dessa forma estabelecemos um jeito revolucionário de lidar com a vida. E cada vez mais esse jeito Umbandista de lidar com a vida se afasta daquelas vertentes que um dia nos serviram para nosso nascimento.
Devemos muito a elas, respeito, gratidão, mas para continuarmos a nossa evolução científica, histórica, sociológica e teológica temos que ficar com a mente aberta.
É certo que muitos ainda podem se apegar aos antigos parâmetros, mas o perfil do Umbandista mudou, e além da teologia Umbandista (que é nosso dever nos aprofundar), precisamos ter a noção de que cada vez mais vem se estruturando isso que chamamos de Ciência Umbandista que mescla fatores científicos, históricos e sociais na elaboração de nossos conceitos e vivência dentro da religião.
A Umbanda atual não precisa e nem deve se sentir obrigada a transitar seus debates cosmológicos apenas nas referências religiosas que lhe deram origem, pois temos capacidade de nos colocar autonomamente perante a questões variadas e complexas com o auxílio daquilo que muitas religiões buscam negar, mas que para nós é fundamental, a Ciência!!!
É certo que muitos ainda podem se apegar aos antigos parâmetros, mas o perfil do Umbandista mudou, e além da teologia Umbandista (que é nosso dever nos aprofundar), precisamos ter a noção de que cada vez mais vem se estruturando isso que chamamos de Ciência Umbandista que mescla fatores científicos, históricos e sociais na elaboração de nossos conceitos e vivência dentro da religião.
A Umbanda atual não precisa e nem deve se sentir obrigada a transitar seus debates cosmológicos apenas nas referências religiosas que lhe deram origem, pois temos capacidade de nos colocar autonomamente perante a questões variadas e complexas com o auxílio daquilo que muitas religiões buscam negar, mas que para nós é fundamental, a Ciência!!!